quarta-feira, 12 de setembro de 2012

"Tu és o meu vaso escolhido"



"Depois disso o Senhor escolheu mais setenta e dois dos seus seguidores e os enviou de dois em dois a fim de que fossem adiante dele para cada cidade e lugar aonde ele tinha de ir. Antes de os enviar, ele disse: - A colheita é grande, mas os trabalhadores são poucos. Por isso, peçam ao dono da plantação que mande trabalhadores para fazerem a colheita. Vão! Eu estou mandando vocês como ovelhas para o meio de lobos. Não levem bolsa, nem sacola, nem sandálias. E não parem no caminho para cumprimentar ninguém. Quando entrarem numa cidade e forem bem recebidos, comam a comida que derem a vocês. Curem os doentes daquela cidade e digam ao povo dali: "O Reino de Deus chegou até vocês".
Lucas 10, 1-9.


Você já parou para pensar por que você é cristão? Por que o cristianismo encontrou agasalho tão forte em tantos lugares? Por que sobreviveu de forma tão firme através dos séculos, sendo a religião de um pequeno grupo sem poder político ou econômico?

Claro, além de ser a fé que você escolheu, há motivos muito fortes na história para isso: após o desencarne de Jesus, os 12 apóstolos experimentaram dúvidas e temores atrozes sobre como levar adiante o movimento da divulgação da Boa Nova. Viviam em um contexto em que o Cristianismo ocupava posição marginal diante do judaísmo e da religião politeísta romana, então dominantes. Era preciso muita coragem e argúcia para levar a frente os propósitos de consolo do Cristo, sem possuir a sua elevação moral e suas habilidades.

Entretanto, Jesus jamais deixou de estar entre os homens de Bem; a espiritualidade fez-se presente de forma intensa e firme, elevando os pescadores com um ruído a uma pregação cálida e intensa, em diversas línguas diferentes, arrebatando adeptos e trazendo novas almas para a sublime seara do Cristo (1)

A verdadeira fé dos discípulos levou-os a procederem curas e prodígios (2); levou-os a pregar a nova mensagem de amor e união não só na Casa em Jerusalém, mas também na região próxima e muito, muito além do que se poderia imaginar que homens simples pudessem chegar sem recursos (3).

Quando pensamos em viagens missionárias, é inevitável lembrarmo-nos de Paulo, vaso escolhido do cristo (4) e grande divulgador do Cristianismo. Ao todo, Paulo de Tarso viajou 25.000 quilômetros, sendo 11.000 por mar e o restante por terra, quase sempre a pé. Tendo fundado dezenas de comunidades cristãs, passa depois a escrever, quando necessário, cartas aos amigos e aos grupos de vivência do Evangelho, reunidas hoje no novo testamento e conhecidas como as Cartas de Paulo.

Entretanto, além de Paulo de Tarso, muitos outros foram aqueles que levaram o testemunho e a vivência de sua fé para o mundo, chegando, por vezes, a viver o martírio pelo Cristo. Pedro, pedra e líder da Casa do Caminho; Lucas, companheiro de Paulo, evangelista e narrador dos "Atos dos Apóstolos"; Timóteo, jovem trabalhador desde o início de sua puberdade; Maria Madalena, exemplo de transformação inolvidável e vivência do Evangelho; Marcos, incansável trabalhador e baluarte da comunidade de Alexandria; Joana de Cusa, cuja entrega profunda nos comove inevitavelmente até os dias de hoje; Ignácio de Antioquia, que mesmo sem ter conhecido o Cristo fez-se intenso trabalhador em um dos centros mais importantes do antigo Império Romano.

Muitos outros, incontáveis são os homens que fizeram o Cristianismo ser o que é hoje, levando a Palavra aos que a desconheciam e vivendo o exemplo de transformação e amor. Através das eras, reverbera um chamado, um convite que vem do próprio Cristo e que se revifica a cada vez que alguém escolhe a melhor parte, atravessa a porta estreita e toma seu jugo: "Se quiseres, farei de vocês pescadores de homens".

Quer conhecer um pouco mais de alguns desses homens dos primeiros tempos? Quer buscar compreender um pouco mais sobre o seu papel, hoje, na continuidade dessa mensagem viva e intensa? Esteja conosco no dia 30 de setembro. "Tu és o meu vaso escolhido"

(1) O episódio do dia de pentecostes, descrito em Atos 1, 1-41
(2) Atos 2, 43
(3) Atos, capítulo 13 e seguintes
(4) Atos 9, 15

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

I EMSEJA-CEIVA


É com grande satisfação que convidamos todos os jovens das mocidades de Juiz de Fora para o I EMSEJA-CEIVA – I Encontro de Mocidades da Sociedade Espírita Joanna de Ângelis e do Centro Espírita Ivon Costa.
Serão discutidos assuntos relativos ao tema: “Liberta-te do mal: o poder da ação frente aos meus conflitos no mundo”.
Não deixe de participar, será um dia de muita confraternização!

Data: 26 de agosto de 2012
Horário: de 8 às 18h
Local: Centro Espírita Ivon Costa
Investimento: R$ 5,00
Inscrições até 20/08 com os coordenadores das mocidades

Dúvidas ou informações:
Guilherme: 8821-4640; Lívia: 8829-5257; Natália: 8832-5152 ou Thaysi: 8859-2656.

Muita paz e até lá!

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

O que tem na mocidade espírita?

E perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão
e no partir do pão e nas orações
(Atos, 2:42).



Pelo nosso país afora, há inúmeros grupos de mocidades espíritas, construídos em formatos diferentes, com formas diversas de trabalhar o conteúdo e com propostas distintas de programação e mediação de estudo. O que, então, subsume todos esses grupos sob um mesmo nome? Qual a característica central da mocidade espírita? O que é mocidade, afinal de contas?

Primeiramente, a mocidade é um grupo de jovens. A definição de jovens, porém, não apresenta consenso. Órgãos como a ONU (Organização das Nações Unidas) ou o Banco Mundial estipulam a idade de 15 a 24 anos; a definição da OMS (Organização Mundial da Saúde) engloba meninos e meninas a partir de 10 anos, e o congresso brasileiro, desde 2010, considera que a faixa da juventude é compreendida entre 16 e 29 anos. Para trabalhadores espíritas que conheceram a doutrina espírita na mocidade, como o caso de Raul Teixeira, a juventude vai até os 25 anos de idade . Seja como for, é o período em que paulatinamente deixa-se o estágio infantil, e boa parte do aprendizado e das interações sociais deixa de ser feita em ambientes doméstico e da escola; os níveis de interação social tornam-se maiores e a independência do reduto familiar cresce gradativamente. Pode-se considerar, em espectro amplo, que a idade para a mocidade é de 13 a 30 anos, sem excluir especificidades e variações possíveis em diferentes contextos.

O grupo de mocidade é, então, um grupo de jovens que se reúnem na Casa Espírita para estudar o espiritismo. Herculano Pires considera que a função primordial do centro espírita é divulgar a doutrina espírita, consistindo essa missão em uma tarefa de educação . Assim, definiremos Mocidade Espírita como lugar privilegiado de interações entre jovens no qual se busca a construção de uma compreensão global da doutrina espírita e das consequências práticas desta para a vida. Entretanto, para que esse espaço seja, de fato, privilegiado, é necessário que se compreenda como é o trabalho com a juventude.

Contando com apenas um encontro por semana, a mocidade não dispõe da
regularidade que tem a escola; lidando diretamente com sujeitos que querem ser desafiados, que gostam de compreender e discutir os temas, que possuem uma série de anseios e curiosidades próprios da adolescência, diferem-se das crianças, com quem, na maioria das vezes, não gostam mais de ser comparados; com um tempo de atenção voluntária reduzido, desejo excessivo de interação e vontade de conhecer o outro, não se adaptam facilmente ao modelo eminentemente expositivo, típico das palestras públicas. Para buscar o melhor trabalho com essa faixa etária, é necessário atentarmo-nos para fatores como o conhecimento do público específico, a seleção adequada dos conteúdos e as formas de mediar os estudos. Essas facetas do grupo de mocidade estão inexoravelmente interligadas, e devem ser consonantes com os objetivos propostos para o trabalho. Diante de tudo isso, a todo momento o coordenador deve se questionar, avaliar sua atuação, a resposta dos jovens e as possibilidades de ir além do trabalho feito.

Na nossa opinião, além das especificidade de cada grupo, há um elemento importante para todos os grupos de juventude espírita: a afetividade. Nosso Raul Teixeira ressalta a necessidade de o coordenador saber fazer-se amigo dos jovens. Não basta ser um excelente conhecedor da doutrina ou um exímio palestrante: o coração do jovem se abre quando nos abrimos, por nossa vez, para ouvi-los e compreendê-los. A tendência da juventude para formar grupos e “tribos” tende a encontrar na mocidade espírita, quando vivida dentro dos ditames da fraternidade cristã e do carinho ao próximo, um espaço de vivência diferenciado e rico, em que as amizades formadas compartilham a crença em um espírito que sobrevive à carne, na justiça divina da reencarnação e no imperativo do amor e da transformação moral.

A convivência fraternal é importante em todos os ambientes e trabalhos de uma casa, mas encontra necessidade especial dentro do grupo de jovens, repleto de sujeitos em busca de fundamentos, de alicerces e de caminhos seguros por tomar. É preciso fazer do abraço e da palavra amiga elementos primordiais dentro do grupo de mocidade espírita, não pela cordialidade flácida e insincera que minora os verdadeiros esforços pela regeneração, mas sim pela verdadeira comunhão de almas e criação de vínculos fortes de amor fraterno, que possibilitarão uma troca potencializada de conhecimentos, experiências e emoções. Por isso perseveravam os apóstolos em suas abençoadas atividades; por isso serão conhecidos os discípulos do Cristo.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Santo Agostinho e o Espiritismo, parte 3: Agostinho, Deus e a Lei Divina

por Fábio Fortes

Quem conhece a Verdade, conhece-a; e quem a conhece, conhece a eternidade; e quem a conhece, conhece o Amor.
Agostinho, Confissões, V, 12


Para nós, espíritas, o conceito de Deus, como o Criador, a “suma inteligência, causa primeira de todas as coisas” (Livro dos Espíritos, questão 1), talvez soe por demais familiar. De fato, a Doutrina Espírita alarga nossas concepções de Deus, que não é mais o ser representado à semelhança do homem, mas é a reunião de toda a bondade, misericórdia, justiça e perfeição, que o identifica, sem dúvida, com o amoroso “Deus-Pai” revelado por Jesus Cristo. De resto, embora nos faltem ainda recursos intelectuais para a compreensão da natureza íntima de Deus, sabemos, pela Codificação Espírita, que Deus tem como atributos a imutabilidade, a eternidade, a suma perfeição.

Em meados do século IV, porém, muitas ideias até contraditórias existiam acerca de Deus. Com a influência das doutrinas helenistas, do politeísmo antropomórfico greco-romano, da visão judaica da Divindade, Deus poderia ser uma ideia compreendida diferentemente na mentalidade média das pessoas: um ser sobrenatural e vingativo, em nome da Justiça, um herói olímpico, redentor dos homens, ou um conceito abstrato e metafísico regulador da natureza, ainda que frio e distante. A inteligência de Agostinho examinou cada uma das concepções de Deus, oriundas das diferentes escolas da época (neoplatônica, cética, pagã, judaica), para apresentar à humanidade, enfim, um conceito de Deus bastante parecido com a definição que hoje encontramos no Livro dos Espíritos: “Deus, era este o ser incorruptível, indeteriorável, imutável (...) Jamais alma alguma pôde ou poderá conceber alguma coisa melhor do que Vós – sumo e ótimo Bem” (Confissões, VII, 4, 6) .

Como “sumo e ótimo Bem”, Deus é a perfeição, a reunião das virtudes a que pode aspirar a alma humana, portanto, Deus é o Criador de todo o Bem: “Perguntei pelo meu Deus à massa do Universo, e respondeu-me: ‘Não sou eu, mas foi Ele que me criou´”. De resto, a dualidade maniqueísta entre o Mal e o Bem, que, na Idade Média, levaria à concepção dualista de Céu e Inferno, Deus e Diabo etc., não condizia mais com o conceito de Deus enquanto perfeição absoluta e imutável, agente criador do Universo. De fato, enquanto Agostinho se demorava nas doutrinas maniqueístas, custou-lhe reconhecer que o mal, enquanto substância, não existe: apenas o bem é obra da Criação Divina. A alma encarnada, porém, pelo livre-arbítrio, pode tomar caminhos que estejam na contra-mão desse sumo e eterno bem criado por Deus: “Procurei o que era a maldade e não encontrei uma substância, mas sim uma perversão da vontade desviada da substância suprema – de Vós, ó Deus”. (Confissões, VII, 22).

Para Agostinho de Hipona, como para nós, espíritas, o mal não é algo exterior ao homem, a arrastá-lo a determinadas condutas. O mal que possamos vivenciar nasce de escolhas íntimas, é fruto do nosso livre-arbítrio, segundo a nossa vontade, embora em contradição à Lei Divina, que, no entanto, é imutável. Não existe um Deus que castigue o mal, ou puna o pecador. O prejuízo ou o benefício de cada ação humana é regulado segundo uma Lei de caráter universal: “O furto é punido pela vossa lei, ó Senhor, lei que, indelevelmente, gravada no coração dos homens, nem sequer a mesma iniquidade poderá apagar”. (Confissões, II, 9).

A Lei de Deus está indelevelmente inscrita no coração humano, palavras que nos fazem recordar a questão 621 de O Livro dos Espíritos, em que Kardec pergunta aos espíritos: “Onde está escrita a Lei de Deus?” – Na consciência humana, respondem. Segundo os espíritos da Codificação, a Lei de Deus “é eterna e imutável, como o próprio Deus” (LE, 615), tal qual Agostinho reconhecia em seu tempo: “Em que tempo ou lugar será injusto que “amemos a Deus com todo nosso coração, com toda a nossa alma e com toda a nossa mente, e que amemos ao próximo como a si mesmo?” (Confissões, III, 15). Poderíamos responder com ele: nunca, em lugar algum a lei máxima do Amor será revogada.

A expressão dessa Lei, a iluminar, então, o pensamento de Agostinho e a esclarecer a Humanidade nos dias de hoje é, portanto, o Amor, como mostra a mensagem de Jesus, como testemunham os bons espíritos, como ecoa o pensamento agostiniano nas palavras da Codificação Espírita. A vivência do amor a Deus, ao próximo e a si mesmo é a chave para a transformação moral do homem, o resultado do processo de autoconhecimento e evolução humanas, o espelhamento da conduta de acordo com a Lei de Deus. Pois, se soubermos amar, podemos fazer qualquer coisa, e qualquer coisa será reflexo da ação divina no mundo por intermédio de nós, como também afirmava Santo Agostinho, em uma de suas máximas: Ama e faça o que quiseres.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Santo Agostinho e o Espiritismo, parte 2: Agostinho na estrada de Damasco

por Fábio Fortes


O Cristo não nos deixou. Fugiu dos nossos olhos para que entremos no coração e, aí, o encontremos. Sim, separou-se de nós, com relutância, mas ei-lo aqui.
Agostinho, Confissões, IV, 19


Agostinho, como outros apóstolos do Cristianismo primitivo, será sempre lembrado pelos incessantes esforços de transformação despendidos ao longo de sua longa existência. Como Paulo, que na estrada de Damasco, viveu o momento culminante de sua conversão ao Cristianismo, se revelando, em seguida, fiel colaborador da Boa Nova, também Agostinho é representado como o estudioso maniqueísta, ou o filósofo cético, que irrompeu uma mudança essencial em sua vida, abandonando hábitos e formas de vida, em prol da vivência pura da mensagem cristã.

Diferente de Paulo, entretanto, e de forma talvez mais parecida com o que ocorre com cada um de nós, a “estrada de Damasco” de Agostinho não se realizou como um evento particular em determinado passo de sua vida, mas foi fruto de situações e reflexões ao longo de toda sua existência, mesmo depois de sua conversão.

Nascido em Tagaste, no ano de 354, sua vida até os 32 anos seguiu o padrão da de um jovem que pôde se educar segundo as convenções da época. Na fase adulta, tornou-se mestre de gramática e retórica, tendo ensinado aos jovens de Tagaste, Cartago, Roma e Milão os recursos e estratégias verbais de persuasão retórica, além da leitura de textos da tradição clássica. No século IV, o norte da África, como muitas outras partes do Mediterrâneo, era uma província do Império Romano e as disciplinas de Retórica e Gramática eram os caminhos necessários para o cidadão culto atingir a prestigiosa carreira pública política ou forense. Ser mestre de retórica naquela época, era, por assim dizer, conviver com personagens do topo da escala social.

Segundo nos narra em suas Confissões, Agostinho nasceu de uma mãe já convertida ao Cristianismo, Santa Mônica, e de um pai pagão, Patrício. Desde criança, sentiu dentro de si um apelo à compreensão das coisas, que lhe levou à crença em Deus; no entanto, sem compreendê-lo, buscou diferentes doutrinas filosóficas e religiosas, entre as quais o maniqueísmo, o platonismo e o ceticismo, que lhe ilustraram o espírito com o interesse e conhecimento das letras, mas não satisfizeram, ao longo da vida, a sua sede de saber. Ao mesmo tempo, confessa ter sido arrastado pelos interesses mundanos da glória, do destaque social e pelos apelos da sensualidade.

É intrigante pensar que, de repente, como Paulo, na estrada de Damasco, Agostinho também, em dado momento da vida, decidiu abrir mão da carreira prestigiosa de mestre de retórica em Milão e da satisfação dos prazeres imediatos do sexo, das ambições políticas e materiais. A conversão de Agostinho se afigurou, muitas vezes, ao longo da história, como um evento milagroso, que lhe rendeu, afinal, o título de “Santo” e “Doutor da Igreja”. De fato, após os 32 anos, Agostinho não hesitaria em voltar para sua obscura terra natal, doar seus bens e seguir o Cristo.

No entanto, a leitura das Confissões já revela que a transformação foi um processo demorado, resultado, por um lado, da reflexão nunca interrompida sobre os eventos da vida, e, por outro, dos questionamentos sobre os conhecimentos obtidos nos livros. Para a conversão agostiniana, entram, sem dúvida, também o exemplo de sua mãe, a crente devota e fervorosa do Cristo; a inteligência de Santo Ambrósio, então Bispo de Milão, que lhe ofereceu uma maneira de interpretar a Bíblia de forma racional; e o impacto das provas da vida, com a perda de um amigo de infância. No entanto, também se destaca na transformação agostiniana um perene olhar para dentro de si, um autoquestionamento contínuo, auxiliado pelo estudo incessante das doutrinas e filosofias de sua época, autorreflexão que flagramos, por exemplo, ao lermos suas Confissões. Essa obra, em particular, é o grande exemplo daquele exame metódico e diário que Agostinho nos recomenda, enfim, na questão 919 de O Livro dos Espíritos, com a diferença de que, em vez de um dia, a obra faz uma revisão de toda uma vida.

Tais elementos se somam à constatação, depois adquirida, de que a transformação é, de fato, um movimento da alma, que, senhora da vontade, modifica a si própria, libertando-se do erro, que não é uma fraqueza da carne, mas um atributo provisório do espírito: A alma manda ao corpo, e este imediatamente lhe obedece; a alma dá uma ordem a si mesma, e resiste! Ordena a alma à mão que se mova, e é tão grande a facilidade que o mandado mal se distingue da execução. (Confissões, VIII, 25). É na alma, o espírito imortal, que reside a fraqueza e o erro, não no corpo. Portanto, segundo Agostinho, compete a esta o exercício de sua vontade, que, tal qual comanda o corpo, é também capaz de comandar-se a si mesma.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Santo Agostinho e o Espiritismo, parte 1: Agostinho segundo o Espiritismo

Por Fábio Fortes

Criaste-nos para Vós e o nosso coração vive inquieto, enquanto não repousa em Vós.
(Agostinho, Confissões, I, 1)


No movimento espírita contemporâneo, o nome de Santo Agostinho é quase sempre associado à questão 919 do Livro dos Espíritos, em que Agostinho, como participante da Falange da Verdade, nos esclarece sobre a necessidade do autoconhecimento para resistirmos aos apelos do mal. Na sequência da mesma questão, é o próprio Agostinho quem nos indica uma maneira prática de se atingir o conhecimento de si mesmo, através do exame diário e metódico dos pensamentos e ações, e a consequente mudança de hábitos nos dias seguintes.

Não por acaso, a questão, que talvez seja uma das mais lembradas pelos espíritas, encerra, sob o nome do preclaro filósofo da doutrina cristã, duas das ideias mais caras à Doutrina Espírita: o autoconhecimento e a transformação. Por outro lado, enquanto a voz de Agostinho seja sempre relembrada nos estudos doutrinários pelas suas proverbiais clareza e profundidade de análise da questão oferecida por Kardec, poucos, entretanto, conhecem um pouco mais do pensamento e da vida de Agostinho e dos ensinamentos legados à humanidade durante sua exemplar e missionária passagem pela Terra.

O Agostinho da Revelação Espírita, é, como diz Erasto, em o Evangelho segundo o Espiritismo, cap. 1, it. 11, o “espírito que vê com olhos que não via enquanto homem”, é o colaborador espiritual que revisita a Terra em nova missão, aliado a tantos outros companheiros espirituais encarregados de fazer florescer no mundo a Lei da Verdade, codificada por Allan Kardec. Agostinho, como, de resto, também Emmanuel, João Evangelista, Erasto, São Vicente de Paulo, entre outros, apresentam a Doutrina dos Espíritos como a consequência maior de uma série de comunicações ostensivas entre o mundo visível e o invisível. Em conjunto, proclamam: “chegaram os tempos marcados pela Providência para uma manifestação universal e que, sendo eles os ministros de Deus, e os agentes de sua vontade, têm por missão instruir e esclarecer os homens, abrindo uma nova era para a Regeneração da Humanidade” (O Livro dos Espíritos, prolegômenos).

O colaborador que se soma à falange de espíritos do bem, imbuído da nobre missão de esclarecer o Evangelho pelas novas luzes do Consolador Prometido, não é outro, senão o mesmo Agostinho que, séculos antes, exemplificara com sua vida e obra, a necessidade de transformação por intermédio do autoconhecimento. Isso quer dizer que o outrora Bispo de Hipona já deixara em sua vida uma exemplificação para o que, na Era do Espírito, ele vem nos relembrar: a transformação moral e o autoconhecimento. Ademais, como também Erasto nos esclarece, este Agostinho que assina, entre outros, a obra espírita, não veio destruir o que edificou com o testemunho de sua vida no longínquo século IV, quando o mundo civilizado e pagão, em ruína, se abria para a construção cristã. Afirma Erasto: “Liberta, sua alma entrevê claridades novas, compreende o que antes não compreendia. Novas ideias lhe revelaram o sentido verdadeiro de algumas sentenças. (...) Sem renegar a sua fé, pode constituir-se disseminador do Espiritismo, porque vê cumprir-se o que fora predito.”

Por encontrar no Agostinho de Hipona a predição dos saberes que tanto admiramos no Agostinho da Doutrina Espírita, é que gostaríamos de destacar, nas próximas edições, alguns aspectos do pensamento agostiniano que perduram à ação do tempo e às mudanças sociais; aspectos, em suma, que, inalterados com a sucessão dos dias, continuam a ser expressões da revelação divina, no seu caráter de universalidade e atemporalidade, por reconhecermos que, na vida terrena de Agostinho, possamos encontrar, como ele já nos indica, uma maneira prática de nos libertarmos de nossas dificuldades presentes: Fazei o que eu fazia, quando vivia na Terra...

sábado, 23 de junho de 2012

Pedro e João

Entre os doze apóstolos do Cristo, havia caracteres diversos, com anseios, esperanças e necessidades diferentes. O pequeno grupo formado pelo Messias, há quase dois mil anos na Galileia, é um micro-cosmo da nossa realidade e da nossa sociedade, e o convite feito pessoalmente pelo Cristo se estende até os dias de hoje a cada um de nós: “Segui-me, e eu farei de vós pescadores de homens”. No convite aos primeiros discípulos, os evangelhos sinóticos são unânimes em assumir a presença de Simão Pedro e João.
Pedro era o mais velho de todos os doze. Pescador por toda sua vida, casado e com pelo menos um filho, não teve estudos formais; tinha as concepções arraigadas construídas ao longo de sua existência e certa tacanhez na lida com os outros. João, o mais jovem dos discípulos, era também um pescador cheio de vida e entusiamo. De comparações imaginativas, tinha a ambição típica da juventude, e muitas vezes um impulso de ocupar lugares que ainda não lhe cabiam.
Pedro é convidado a seguir Jesus sobre as águas, e caminha sobre elas fascinado por algum tempo, até que o homem velho, levado por suas desconfianças e incertezas que acumulara ao longo da jornada, duvida e afunda (Mt 14:22-32). Recebe a repreensão do próprio Cristo, por ter sido fraco em sua fé. Por outro lado, João, no ímpeto de uma juventude que ainda não compreende a necessidade de se conquistar os próprios méritos, pede ao Cristo que lhe deixe sentar ao seu lado no Reino dos Céus (Mc 10: 35-45); o Rabi responde-lhe, severo, que o mais importante no Reino seria o que mais servisse na Terra.
Pedro, o mais vivido, é sempre o primeiro a questionar o Cristo, pedindo-lhe que explique suas parábolas (Mt 15:15); é quem quer saber se será sete o número limite de perdão às ofensas (Mt 18:21); é quem responde a Jesus sobre a multidão que o cerca no episódio da mulher hemorroíssa (Lc 8:42-48) e, julgando-se detentor da autoridade da senectude, chega a repreender Jesus, quando este declara que o Filho do Homem deveria padecer (Mc 8:30-33). João, ao contrário, tem poucas falas relatadas nos Evangelhos; entre elas, lembramos o momento em que ele relata orgulhosamente a Jesus, como quem busca aprovação, que proibira um homem de curar em Seu nome, sendo admoestado pelo Mestre: “quem não é contra nós, é por nós” (Lc 9:49-50). A personalidade impetuosa de João é provavelmente marcante, pois não seria à toa que o Cristo o chamaria “Filho do Trovão” (Mc 3:17).
Pedro, na entrega absoluta de quem sabe o que espera, oferece a própria vida pelo Cristo (Jo 13:17); afirma, no orgulho dos que já muito viveram, que não se escandalizará por causa do Rabi, mesmo que todos se escandalizem (Mt 26:33), e sofre mordazmente quando percebe sua fraqueza, ao negar o Mestre no momento derradeiro (Mt 26:69-75). João, o único evangelista que relata em seu Evangelho a promessa de Jesus da vinda do Paráclito – o Consolador –, no orgulho da juventude que se julga onipotente, diz a Jesus que ele e seu irmão são capazes de beber do mesmo cálice que o Messias, e de ser batizados pelo mesmo batismo que o Mestre (Mt 20:22).
O Senhor escolheu homens que possuíam defeitos, assim como temos os nossos. E nas mãos desses homens imperfeitos, Jesus colocou tarefas de importância imprescindível para a cristalização do Cristianismo nascente. Na responsabilidade do frágil, e por vezes obtuso Pedro, o Cristo lança as fundações da sua ecclesia – a comunidade de seus seguidores (Mt 16:13-23), devotando-lhe a confiança que o mais experiente de seus amigos merecia: “Tu és pedra, e sobre essa pedra edificarei minha Igreja”. João, o discípulo irrequieto e amado, que deita sobre o peito do Cristo para lamentar pela morte iminente do Messias (Jo 13:23), recebe a incumbência de cuidar de Maria, dizendo-lhe, ao pé da cruz: “Eis aí tua mãe” (Jo 19:27).
Todas as casas espíritas têm “Pedros” e “Joões”.
Em todo ambiente sagrado de trabalho, ocuparemos o papel ora daquele que se arroga em ser possuidor da verdade, ora daquele que deseja o cargo burocrático sem o merecimento da folha de serviço; ora daquele que tem dificuldades no trato gentil com os irmãos da seara, ora daquele que esquece o mais importante pelos festejos excessivos. Cabe a nós seguir o exemplo dos irmãos em Cristo e perceber que a cada um é pedido apenas Reforma Íntima constante e o melhor que temos para dar.
Pedro e João foram amigos desde sua sociedade como pescadores (Lc 5:1-11). O carinho que tinham um pelo outro aparece na última ceia (Jo 13:24-26), no reencontro que ambos tiveram com o mestre logo após a ressureição (Lc 22:7-13) e continua após a partida definitiva do Mestre do plano terrestre (At 3:4, 4:13, 8:14). O sucesso de qualquer empreitada na seara cristã não está na revolução completa das coisas pela juventude que chega, nem na manutenção absoluta das formas de pensar e agir dos trabalhadores de longa data; mas sim na compreensão e na confraternização entre ambos, na troca de experiências e colaboração mútua, caminhando no sentido de perceber que a possibilidade de trabalho e de amor não tem limite nem restrição de idade.



Texto composto a partir de palestra proferida no "I Encontro sem fronteiras do Jovem Espírita", realizado em Poços de Caldas em maio de 2012

sábado, 28 de abril de 2012

Homossexualidade e Respeito

Vivemos em uma época de discursos politicamente corretos e virtual valorização acadêmica da diversidade. Interessante notar que em nossas vivências cotidianas, no entanto, ainda encontramos bastantes dificuldades em aceitar e respeitar os outros em suas singularidades. A orientação homoafetiva é um exemplo claro desta contradição, posto que o sujeito que assim se assume enfrenta toda uma série de desafios para exercer tranquilamente seus direitos e suas opções.
Lamentavelmente a sociedade vem protagonizando uma série de violências contra os sujeitos homossexuais, desde a simbólica, passando pela religiosa, chegando até à brutalidade das agressões físicas gratuitas. É fácil encontrar notícias recentes que relatam casos, em grande quantidade, que se repetem mundo afora, demonstrando o quanto os dircursos de inclusão continuam no plano da idealização cômoda, sem uma efetivação nas práticas.
Porque nos é tão complicado respeitar a orientação homossexual? Quais padrões culturais e psicológicos mobilizam tal rejeição? Onde a lição cristã de não julgamento? Onde o ensino Espírita da necessária variedade no contato social? O aclamado mundo de regeneração comporta tal discriminação? Precisamos criticar o paradigma da hetero-normatividade e avançarmos para um novo entendimento e uma nova postura diante da orientação homossexual, mais lúcida, ponderada e respeitosa.
Convidamos você a dar um passo neste sentido, participando conosco do Bate-Papo Espírita!!! Esta é a última semana de inscrições. Procure o coordenador de sua Mocidade e venha papear em grupo, sob à luz do Espiritismo.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Homossexualidade no Centro Espírita

Uma vez que todo tipo de pessoa frequenta a instituição espírita, com vínculos mais ou menos fortes, é esperado que esta diversidade também se verifique no que tange à orientação sexual. Muito óbvio que adentram às portas de qualquer casa espírita indivíduos que se assumem heterossexuais, homossexuais ou bissexuais.
Ocorre que esta constatação sempre trouxe consequencias polêmicas nos arraiais espiritistas, posto que as visões e organizações de cunho tradicionalista e preconceituoso, trataram de marginalizar, doutrinaria-socialmente, as pessoas declaradas ou suspeitas (este é o termo) de serem homossexuais.
Em vários seminários e pinga-fogos, ouvimos opiniões semelhantes, discursando pela não inclusão do homossexual nas lides espíritas. A justificativa se baseia no desequilíbrio de que são portadores, na necessidade que têm de absterem dos pecados da comunhão homoafetiva, e do mal exemplo que seriam para os demais.
Mas, afinal, homossexualidade indica comportamento pervertido? A orientação sexual é que define o comportamento sexual? Será que tal postura não cria uma cultura cínica de silêncio e vidas paralelas dentro do Centro Espírita? Esta discriminação encontra algum apoio nas passagens Evangélicas? Como os Espíritos se posicionam diante de tal questão?
Se você deseja aprofundar este debate, de maneira respeitosa e madura, está convidado a participar do Bate-Papo Espírita!!! Procure o coordenador de sua Mocidade e se inscreva.
Aproveito e sugiro uma pequena bibliografia espírita sobre o tema. Caso desejem ler antes do evento, será de grande utilidade para as discussões.

§  O Livro dos Espíritos: itens 132, 200, 201, 202, 207, 208, 216, 228, 229, 258, 259, 261, 264, 269, 335, 367, 368, 369, 370, 385, 695, 696, 698, 699.
§  O Evangelho segundo o Espiritismo: introdução, item II.
§  Revista Espírita: janeiro de 1866, artigo “As mulheres têm uma alma?”.
§  Além do rosa e do azul – recortes terapêuticos sobre homossexualidade à luz da Doutrina Espírita (Gibson Bastos) [CELD].
§  Vida e Sexo (Emmanuel): capítulos introdução, 19, 20, 21, 23, 26.
§  Desafios da vida familiar (Camilo): capítulo I, questões 12 e 13; capítulo II, questões 28 e 29.
§  O jovem espírita quer saber (autores diversos): capítulos “Sexo” e “Homossexualidade”.
§  Atualidade do Pensamento Espírita (Vianna de Carvalho): questões 5 e 179.
§  Pinga-Fogo (Chico Xavier): 1º, questão 35; 2º, questão 40.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Espiritismo e ciberespaço




Aproveitando a proximidade do Bate Papo Espírita de 2012, postamos um texto produzido ao longo do processo de preparação de estudos do Bate Papo Espírita do ano de 2011, Espiritismo e Ciberespaço
As inscrições para o BPE 2012 - "Os Espíritos têm sexos?" estão abertas e são limitadas! Faça sua inscrição com o coordenador de sua mocidade!

Ciberespaço, sociedade e espiritismo
A necessidade de estarmos em lida direta com outros iguais a nós é conhecida desde muito tempo, e sistematizada por pensadores modernos das áreas da educação, filosofia, entre outras. O próprio livro dos espíritos ressalta a necessidade absoluta da vida em sociedade, e na conhecida questão referente ao conhecimento de si mesmo, respondida por Santo Agostinho, ele coloca como pergunta essencial a ser feita para si mesmo: “se ninguém tivera motivo para de mim se queixar”. A forma como o eu é visto pelo outro é, de fato, essencial para a construção da nossa personalidade.
O ser humano está diante do outro em relação direta desde sempre. Primeiramente entre os agrupamentos primitivos de seres humanos, em pequenos grupos de nômades; em seguida, na esfera das cidades, depois do assentamento da humanidade decorrente da descoberta da agricultura e da criação de animais; começa a consolidar-se uma esfera doméstica, em que as relações entre familiares tornam-se mais estreitas; diferentes grupos sociais interagem sob regimes absolutistas, teocráticos, tribalistas e democráticos.
Com o descobrimento de alternativas tecnológicas para melhoria do trabalho e da produção, o mundo vai vivendo um aceleramente cada vez maior em todas as suas instâncias; o desvanecimento da grandeza do espaço que cortava continentes por meio das novas formas de transporte e comunicações torna todo o mundo, paulatinamente, um grande villarejo global. Em consonância com esse encurtamento das distâncias, surge um novo contexto em que as relações sociais entre os homens se torna possível: a internet.
As relações entre os jovens nos sites de relacionamentos, twitter e programas de conversa estão carregadas de um páthos intenso, como é próprio de sua idade. No geral, arrolam-se especialmente declarações emotivas a respeito das amizades, sobre a importância de uns na vida de outros, e de ações praticadas regularmente e/ou sendo praticadas no momento pelos internautas. Assim, os jovens fazem-se cada vez mais presentes na vida um do outro, seja por sentir-se importante em receber e dedicar textos à amizade entre amigos, seja ao conhecer os detalhes da vida cotidiana dos outros por meio de mensagens.
Cumpre-nos questionar a respeito da natureza dessas relações. Não se deve negar que, pelo jogo da simulação, pela construção de um perfil mais próximo do que quero ser do que da realidade, pelo uso de apelidos, pela inscrição em fóruns e comunidades de assuntos específicos, pela possibilidade de esconder as expressões faciais, e ações simultâneas e alguns pensamentos por uma conversa do messenger, o jovem tem uma nova gama de possibilidades para a construção da sua subjetividade e identidade, baseada na forma como o outro o vê, na forma como vê o outro e na forma como deseja ser visto.
Entretanto, cumpre-nos também questionar-nos se esse tipo de interação não deixa de lado pontos importantes da relação face a face, do toque, do olhar, da troca de energias salutares e, muitas vezes, da exposição sincera e assertiva. Mesmo que muitas das vezes os jovens acabam por fortalecer laços de amizade e se tornarem mais próximos por meio de relações sociais suplementares advindas de tais meios, não se deve abdicar da conversa franca. A exaltação das virtudes na frente dos amigos se revela mais difícil do que em meio virtual, deflagrando uma certa característica de “proteção de face” da criação de textos emotivos via internet.
Ficam diversas questões relativas ao tema, mas permanece sempre a questão básica a que nos norteia o conhecimento do Espiritismo: a busca do equilíbrio. Desviando dos exageros de quem se entrega por horas à vida virtual, preferível, para alguns, à vida diante do outro, o apelo ao mundo ciberssocial deve ser encarado como vinculado à nossa existência como um todo, e o que for apreendido em termos de fantasia e simulação deve ser, mais cedo ou mais tarde, cotejado à vida.
A cultura contemporânea valorizante das aparências, a velocidade e a simultaneidade com que as coisas acontecem, a hibridez e liquidez dos produtos culturais de nosso tempo podem nos levar a uma vida quase contemplativa, de quem não conversa com os amigos da sala mas tem centenas de companheiros no Orkut, de quem busca na fluidez da fama os heróis dos seus valores ou a catárse das suas frustrações, de quem prefere os prazeres e as conquistas fluidas às verdadeiras amizades e caminhos. Lembremos, então, da exortação do Cristo: “Onde estiver seu tesouro, aí estará seu coração”.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Homossexualidade é patologia?

Muito se tem discutido sobre a natureza do comportamento homossexual, desde o século XIX, em busca de explicações científicas para suas causas e manifestações. Em boa parte das considerações, o viés da anormalidade permeou os discursos e as práticas dos opinadores.
Curioso notar que, nos ambientes religiosos, de modo geral, tais abordagens de cunho bio-patológicas ganharam forte adesão e reforço dos textos ditos sagrados e de autores (con)sagrados. A homoafetividade seria um erro sob múltiplos pontos de vista: biológico, religioso, social.
Os movimentos espíritas também fizeram coro com esta visão, e utilizaram-se de interpretações dos textos da Codificação na tentativa de embasar doutrinariamente suas conclusões, caridosamente condenando a prática homoerótica mas amando as pobres criaturas tentadas à mesma...
Tradicionalmente, escutamos oradores e figuras de relevo falarem sobre a necessidade de abstinência e vida dedicada ao próximo, longe destas vivências pecaminosas e anormais. Quantos indivíduos sentiram-se lesados em sua intimidade e incompreendidos em sua orientação sexual nas reuniões espíritas?
Chegamos a um momento de questionamentos mais lúcidos e pragmáticos, de alguma forma reflexo das lutas dos gays, e as respostas conservadoras e puritanas não nos satisfazem mais. Afinal, qual o problema em ser homossexual? Porque tanto preconceito e discriminação? Será que os Espíritos consideram tal orientação uma anomalia? O que os Espíritos dizem de fato sobre tão polêmica questão?
Se você tem interesse neste debate, venha construir novas ideias a respeito em nosso Bate-Papo Espírita!!!  Procure o coordenador da sua Mocidade e se inscreva.

sábado, 17 de março de 2012

Eu e tantos outros

Eu rotulo.
Tu rotulas.
Ele rotula.
Nós rotulamos.
Vós rotulais.
Eles rotulam.

Qual a íntima maioral adversidade?
Aceitar e valorizar a... diversidade

Herdeiro do Universo de ordem e beleza
Nossas variedades são a grande riqueza

Aspirante do porvir, milênio glorioso
A diferença é o intercâmbio ditoso

Sem o outro, quem sou eu?

Como inundar o peito de superior emoção
Sem a presença afetuosa do amigo no coração?

A diferença humana é a mola do progresso
A essência da vida e a chave do sucesso

Aprendemos a tolerância no lidar
Preciosa lição de reencarnar

Sem o outro quem sou eu?

O respeito mútuo, atitude fundamental
Nova sociedade, crescimento espiritual

É Deus a se expressar na criatura
Em particular retoque, moldura

Bastam os rótulos! Busquemos o cuidado
Acolher a todos, o gesto elevado!

Sem o outro quem sou eu?


ESPIRITISMO E ESPERANTO - Parte II

Por Fábio Fortes


Estamos ainda muito longe das regiões ideais da mente pura. Tal como na Terra, os que se afinam perfeitamente entre si podem permutar pensamentos, sem as barreiras idiomáticas; mas de modo geral, não podemos prescindir da forma, no lato sentido da expressão. (...) Os patrimônios nacionais e lingüísticos remanescem ainda aqui, condicionados a fronteiras psíquicas.
(André Luiz/Francisco C. Xavier. Nosso Lar, 24)

Entre espíritos perfeitamente afinizados, as barreiras linguísticas se superam pela linguagem do pensamento, mas, no mais das vezes, entre espíritos que requerem o esforço das relações ainda nem tão afinizadas, as línguas, os costumes, as culturas, representam barreiras que se interpõem ao progresso comum. Assim também ocorre na Espiritualidade próxima à Terra: quantos socorros e auxílios seriam mais eficazes se intermediados pela clareza da compreensão humana?


Parte II – Esperanto e Doutrina Espírita

A relação entre a Doutrina Espírita e o Esperanto começou em 1909, quando o então presidente da Federação Espírita Brasileira, aceitando recomendação do movimento espírita francês, resolveu apoiar a causa esperantista. Em meados dos anos 30, Guillon Ribeiro, espírita e esperantista, tradutor das obras de Kardec, iniciou um processo de propaganda e divulgação editorial do Esperanto, abrindo espaço para que dicionários, gramáticas e obras didáticas do Esperanto fossem publicadas pelo signo da FEB. Também as obras da codificação foram traduzidas para o Esperanto, atividade lealmente apoiada até os dias de hoje. Em 1940, pela psicografia de Chico Xavier, Emmanuel enviou a mensagem “A missão do Esperanto”, longa página que destaca o valor do movimento esperantista para a pacificação universal:
“Também o Esperanto, amigos, não vem destruir as línguas utilizadas no mundo, para o intercâmbio dos pensamentos. Sua missão é superior, é a da união e da fraternidade, rumo à unidade universalista. Seus princípios são os da concórdia e seus apóstolos são igualmente companheiros de quantos se sacrificaram pelo ideal divino da solidariedade humana”.
Em 1959, centenário de nascimento de Zamenhof, o Espírito Francisco Lorenz – que, quando encarnado, havia sido um dos esperantistas de primeira hora, tendo publicado obras de ensino de Esperanto ainda para falantes da Tchecoslováquia, região de onde emigrara, tempos depois, para se estabelecer, enfim, no Brasil, onde também atuou incessantemente em prol do Espiritismo e do Esperanto – publicou a obra bilíngue “Esperanto como Revelação”, psicografada nas duas línguas por Chico Xavier. Nesta obra, destaca-se o papel de Zamenhof como missionário do bem, em prol de um ideal de fraternidade entre os povos, em busca da clareza da comunicação humana, a favor da criação de uma cultura verdadeiramente internacional, neutra e que tivesse como princípio o respeito à diversidade humana e a paz. Assim afirmou Lorenz, pela mediunidade de Chico:
“Cercando-se de assessores eficientes, o construtor da unificação iniciou dilatados estudos e, conjugando as mais conhecidas raízes idiomáticas de vários povos, concretizou, em quase meio século de trabalho, a sublime realização. Auxiliado pelas numerosas equipes de colaboradores que lhe afinavam com o ideal, o gênio da confraternização humana, que conhecemos por Lázaro Zamenhof, engenhara, com a inspiração divina, o prodígio do Esperanto, estabelecendo-se a instituição de academias respectivas, nos planos espirituais conexos às nações mais cultas do Planeta. Corporifica-se Zamenhof, em 1859, num lar da Polônia, então associada ao Império Moscovita, cujos povos congregados falavam e escreviam em quase duzentas línguas diversas. E, ante as farpas da crítica e sob os latejos da ingratidão, atormentado, incompreendido pela maioria dos contemporâneos, ferido por muitos e apedrejado em seus sentimentos mais caros, recompõe o Esperanto para os povos terrestres, encetando nova estrada para a unificação mundial”.
As virtudes do Esperanto para a divulgação do Espiritismo no mundo, para a congregação dos povos além de suas fronteiras políticas, econômicas e culturais, para a criação de uma cultura internacional sem precendentes na história, para a divulgação dos ideais de paz, respeito e tolerância, independente das barreiras linguísticas, políticas, religiosas e econômicas justificam, por assim dizer, que o Espiritismo o tenha abraçado como uma de suas causas mais caras, em torno da qual há mais de um século os espíritas trabalham. Também as mensagens psicografadas, que revelam a pertinência do Esperanto no contexto das transformações sociais da Terra, que, a partir da Idade Moderna, a vêm preparando para a consolidação da Boa-Nova, atestam a permanência do Esperanto como ideal do futuro, em torno do qual a humanidade se reunirá, livre dos preconceitos sectaristas e das imposições que derivaram sempre do orgulho e do egoísmo, da concepção de que a individualidade precede a coletividade, de que o interesse próprio está acima do bem da humanidade. Há mais de um século, os Esperantistas têm provado o contrário, tendo uma língua e cultura comuns, que não pertence a ninguém e é de todos. O ideal da estrela verde, que na origem significou também “esperança”, continua guiando a humanidade para um estágio mais avançado de compreensão. Significa, também, que a paz e a confraternização serão as bases da edificação do Evangelho no mundo. O Esperanto é uma utopia? Os espíritos vêm testemunhar a seu favor, e tal como o Cristianismo, vêm provar que não.

quarta-feira, 14 de março de 2012

ESPIRITISMO E ESPERANTO


por Fábio Fortes

“Fui criado como um idealista e ensinaram-me que todas as pessoas eram irmãs, enquanto lá fora na rua, a cada passo eu sentia que não havia pessoas, apenas os russos, poloneses, alemães, judeus e assim por diante. Este sempre foi um grande tormento na minha mente infantil, embora muitas pessoas possam zombar de tal “angústia pelo mundo” em uma mente infantil”
(Zamenhof, 1895)

Em um mundo em que as fronteiras linguísticas, em vez de tornar símbolo da riqueza cultural do mundo, se tornam barreiras políticas que redundam em guerras e dominações, parece não haver espaço para o idealismo dos “puros de coração” que se angustiam pelos males do mundo e anseiam pela renovação do planeta. Não é, porém, o que a história provou: no mesmo século que as luzes da Codificação Espírita tocavam o coração de Kardec, em meados do século XIX, em algum lugar na Europa, onde judeus, alemães, russos e poloneses se hostilizavam, nascia Lázaro Ludvig Zamenhof, que não conheceria Kardec ou a Doutrina Espírita, mas construiria um dos maiores legados a favor da divulgação do Espiritismo no Mundo: o Esperanto.


Parte I – O Esperanto no Mundo


O Esperanto é uma língua criada em 1887 pelo médico polonês Lazaro L. Zamenhof. Ele propôs o Esperanto como uma segunda língua auxiliar que permitiria aos povos preservar suas línguas nativas, mantendo suas identidades culturais, ao mesmo tempo em que poderiam comunicar entre si por intermédio de uma segunda língua neutra, de fácil aprendizado. Isso significa que o Esperanto, como língua neutra internacional, não oferece qualquer tipo de favorecimento político ou cultural, pois é um bem cultural disponível a usuários de qualquer nacionalidade, sem pertencer a nenhum povo específico.
Dentre inúmeros projetos de língua internacional, pode-se dizer que o Esperanto é o único que realmente se tornou uma língua viva. Hoje, mais de 100 anos após a sua criação, o Esperanto é falado por uma comunidade de falantes de muitos países do mundo, que o usam em comunicações internacionais, em congressos, em interações pela internet, em viagens pelo mundo etc. Embora se possa alegar que outras línguas naturais sejam igualmente empregadas com certo grau de internacionalidade – como o inglês atualmente –, função que outrora desempenharam, em diferentes épocas, também o francês, o latim ou o grego, nenhuma delas, de fato, alcançou a neutralidade política e linguística, que lhes poderia facultar a criação de uma cultura verdadeiramente internacional. Ao contrário, o Esperanto, não somente se tornou um veículo eficaz de comunicação internacional, como também, ao longo do último século, produziu uma cultura igualmente transnacional, que tem como características a defesa da diversidade cultural e linguística humana. Não sendo uma língua “nacional”, não colocou em perigo as línguas minoritárias –, a cultura da confraternização e da paz entre os povos, a neutralidade e liberdade política, religiosa e cultural, respeitando as diferenças entre as culturas.
Mas o Esperanto funciona mesmo? Não é uma língua morta? Sim! O Esperanto tem um imenso acervo cultural que faz com que seus falantes pertençam a essa comunidade transnacional do Esperanto, e consigam se comunicar sobre todos os assuntos. A literatura em esperanto, traduzida ou original também é muito vasta. A prova de que o esperanto funciona, pode ser vista pela internet. Se você digitar “esperanto” no Google você será conduzido a não menos que 162.000.000 resultados. Na famosa Wikipedia, enciclopédia virtual que reúne artigos em 260 línguas, a sua versão em Esperanto está entre as 20 primeiras em volume de textos disponíveis. Entre as mais de 7000 línguas do mundo, o Esperanto está, em número de falantes, entre as 200 línguas mais faladas, superando muitas línguas nacionais.
Mas sendo uma língua neutra, porque os espíritas estudam o Esperanto?
(Continua...)

domingo, 11 de março de 2012

Bate-Papo Espírita!!!

Estão todos convidadíssimos a debater conosco a importante questão da Homossexualidade.
Já estamos no período de inscrições. Basta procurar o coordenador de sua Mocidade para obter maiores informações.

domingo, 4 de março de 2012

Caravana COMEJUS



por Tiago Nunes

Quarta-feira de cinzas. A noite se aproxima e o tempo fecha. Vai chover. Um jovem entra rapidamente dentro de uma Casa Espírita, procurando alguma coisa. Dali a alguns minutos, três outros jovens chegam, em grupo. Em menos de meia hora mais de setenta adolescentes se encontram dentro de uma mesma sala, assistindo um estudo sobre a prática da Caridade.



Curiosamente, o mesmo fenômeno se repete nos dias seguintes, em várias casas espíritas diferentes. São jovens de diversos lugares de Juiz de Fora que se uniram para fazer uma caravana, visitando uma mocidade espírita diferente a cada dia. Quem já participou da Comejus sabe do que eu estou falando. A caravana Comejus acontece todos os anos, sempre que o encontro de carnaval termina, chegando a reunir dezenas de jovens.

Neste ano a caravana se superou. Mais de nove mocidades espíritas foram visitadas em menos de onze dias. Redes sociais, como o facebook, contribuíram para que os jovens se unissem e combinassem qual casa espírita seria visitada no dia seguinte. Quem foi, viu um grupo alegre e unido. Para Rafaela Doro, que participa de duas mocidades espíritas, a caravana foi uma oportunidade de conhecer novas pessoas e aprender muitas coisas: “Com certeza, sem a caravana não ia ser a mesma coisa. Ela foi, de fato, um complemento da Comejus.”

A Caravana não foi apenas uma atividade educativa. Ela criou laços, desenvolveu amizades, possibilitou o estudo da doutrina espírita, integrou participantes, uniu mocidades. Nesse exato momento em que escrevo esse texto, jovens de mocidades espíritas diferentes, que não se conheciam até pouco tempo atrás, estão combinando pelo facebook de visitar o Educandário Carlos Chagas, amanhã. São os rumos da caravana. São os rumos da juventude espírita.

E o mais interessante de tudo isso é que, na maioria das vezes, a iniciativa de visitar outras instituições espíritas partiu dos próprios jovens. Sem a interferência dos coordenadores, os próprios participantes das mocidades se uniram para visitar casas como o Vida Maior, o Ivon Costa e o Irmã Scheilla. Dessa rede de integração, surgiu a proposta de visitar uma casa espírita diferente por mês. O desafio está lançado, e a primeira mocidade a ser visitada será a mocidade Guarani, do Centro Espírita Fé e Caridade. A visita está marcada para o dia 14 de Março, e você está convidado. Se a unificação do movimento espírita depender dessa galerinha, estamos em ótimas mãos!

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

História do Espirit(ual)ismo


Você já ouviu falar do médium sueco Emanuel Swedenborg? E do médium estadunidense Andrew Jackson Davis, que fazia comunicações psicofônicas em hebraico sobre diversos temas aos 19 anos? E sobre os irmãos Davenport, médiuns de efeitos físicos que enchiam salões com demonstrações de manifestações espirituais como levitação, pancadas e execução de músicas em instrumentos sem que neles tocassem mãos encarnadas?

Se você não conhece nenhum deles, mas desejar conhecer esses e muitos outros, o livro História do Espiritismo, de Arthur Conan Doyle, é uma boa pedida! O autor de Sherlock Holmes não escreve uma história das manifestações espíritas como diletante, mas com a experiência de quem também escreveu importantes textos históricos sobre guerras na África e na Europa. O estilo de leitura, simples e direto, dá gosto de percorrer as páginas e de conhecer paulatinamente um número enorme de médiuns dos quais poucos se lembram.

Entre os fenômenos físicos de Eusápia Palladino, as pesquisas de Crookes e as famosas
peripécias das irmãs Fox (cuja narrativa, no livro, vai muitos anos além do evento em Hydesville), Doyle lança de forma sutil suas opiniões e impressões a respeito dos eventos e de como são encarados pela sociedade da época.

Uma curiosidade a respeito do livro é que o título original em inglês é “História do Espiritualismo” (The History of Spiritualism). A explicação é simples: para todos aqueles que lemos a introdução d’O Livro dos Espíritos, basta lembrar que a palavra “Espiritismo” é cunhada por Kardec na França em 1857 para designar a nova doutrina trazida pelos agentes espirituais. O leitor, nesse sentido, não deve esperar na leitura da obra de Doyle um estudo que siga as diretrizes e métodos usados por Kardec, mas sim um apanhado de como as manifestações se desenvolveram, especialmente na Inglaterra e nos Estados Unidos (existe um único capítulo dedicado a Kardec, sinal de que seu trabalho ainda não havia sido abundamente estudado e discutido em solo anglo-saxão).

Prefaciado pelo sensato estudioso da doutrina Herculano Pires, “História do Espiritismo” é, segundo a modesta opinião de quem escreve, um dos livros espíritas mais interessantes depois da codificação. Vale a pena aproveitar o momento e começar a estudar para a COMEJUS de 2013, na qual os fenômenos anteriores à codificação ocuparão espaço significativo!


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