A famosa banda
Legião Urbana nos legou grandes pérolas da música brasileira, incluindo
composições de natureza reflexiva-crítica do Brasil e das brasilidades. O ponto
alto talvez seja a letra homônima ao título deste texto, na qual é feita uma leitura
geral das condições sócio-culturais da pátria amada. A arte musical nos tem
servido como uma das formas mais notáveis de manifestação de indignações
políticas e das utopias de uma nação melhorada em seu funcionamento e
organização.
Desde os anos
de chumbo da ditadura civil-militar até os dias atuais, seja na MPB ou nos raps
e funks nascidos nas periferias deste imenso Brasil, são as variegadas formas
de veicular pela música as críticas aos problemas graves e comuns da nação. O poder
imediato de comunicar-se aos sentimentos justifica em grande parte a escolha de
tal modalidade artística, bem como de sua fácil penetração em todas camadas
sociais. Some-se a isso a musicalidade que é um dos fatores que compõem nossa
nacionalidade.
Todos nós
crescemos num caldo cultural aonde somos bombardeados com estereótipos sobre
nosso país continental, variando das proposições ufanistas até as objeções mais
pessimistas. Em comum podemos concluir a complexidade de nossa população e seu
alto grau de contradições internas, desafiando os mais experientes analistas e
investigadores. Chegamos ao entendimento,
observando nossa história e realidades, que moramos em diferentes Brasis, que
guardam entre si o desejo de autoidentificação e a necessidade de
diferenciação, simultaneamente.
Um dos caracteres
mais definidores e participadores de nossas identidades brasileiras é o âmbito
do religioso. Parece que ser brasileiro é estar implicado em alguma forma de
discurso religioso ocidental e suas leituras de mundo. A religiosidade marca de
maneira poderosa nossos anseios de autopercepção e identidade nacional
positiva. Há uma certa crença amplamente difundida da cordialidade espontânea
do povo brasileiro, a se expressar em especial por uma acreditada convivência
pacífica de várias matrizes religiosas.
Muito esperado
que tal ânsia fosse verificada também nos movimentos espíritas brasileiros, que
construíram a partir da década de 1930, ideologias e legitimações mediúnicas de
uma supostas missão espiritual relevante da terra
brasilis. De alguma foram este discurso caiu bem na época ufanista em que
surgiu e historicamente tem produzido resignação irrefletida ante um cotidiano
tao penoso e contextos econômicos desfavoráveis. Curioso notar que algo
semelhante aconteceu apenas (por enquanto) na França, através do autor Léon
Denis (vide por exemplo “O mundo invisível e a guerra”).
Diante de tao
complexa questão, sempre com respostas variantes no espaço e no tempo, e após
séculos de exploração estrangeira, a índole brasileira parece inclinada a um
discurso salvacionista-religioso que possa justificar as misérias nacionais e
projetar-lhes um futuro espiritual glorioso, com os missionários brasileiros
conduzindo o globo à regeneração da Humanidade terráquea. O grande consolo das
penúrias e o estímulo a uma nacionalidade comum seria nosso projeto de
liderança espiritual.
A doutrina
espírita nos convoca incessantemente à criticidade de tudo, incluindo às comunicações
mediúnicas. Que país é este que se diz portador de tao elevada e nobre missão? Nossa
história repleta de violências e nossas realidades permeadas de privilégios e
exclusões condizem com uma pátria do evangelho? Lemos em O Livro dos Espíritos,
resposta da pergunta 930: “Numa sociedade organizada segundo a lei do Cristo ninguém
deve morrer de fome.” Podemos considerar o Brasil como Pátria do Evangelho?
Afinal, que país é este?
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